terça-feira, 9 de julho de 2013

ADJETIVOS



Raquel Teles Yehezkel
Rogéria Rodrigues Ferreira







ADJETIVOS
AVALIAÇÃO (3)




Trabalho requisitado pela disciplina
Tópicos de Semântica,
prof. Luis Francisco Dias.










Belo Horizonte, Junho de 2007
Faculdade de Letras / UFMG





Escreva um texto avaliando as possibilidades de se analisar os termos grifados como adjetivo, do ponto de vista da semântica da enunciação.

O adjetivo apresenta peculiaridades importantes na análise semântica por causa de suas possíveis significações, já que grande número deles constitui lugar de inscrição da subjetividade, além de que a propriedade de antepor ou pospor ao nome abre possibilidades de sentidos.
Analisaremos os empregos dos adjetivos com base nas aulas do professor e nos conceitos de “classificação” e “não-classificação” expostos por Maingueneau (1996:133-153) em “Elementos de lingüística para o texto literário”. Grosso modo, os adjetivos são divididos, tradicionalmente,  em “objetivos”, quando são classificatórios (correspondendo aos categoremáticos), e “subjetivos”, quando são não-classificatórios (afetivos e avaliativos; correspondendo aos sincategoremáticos). Os “objetivos” – como casado, loiro, vermelho, retangular – seriam aqueles que atribuem ao nome uma propriedade definível, classificatória, ou seja, independente de qualquer enunciação particular. Os “subjetivos” – como terrível, bom, belo, elegante, grosso – seriam os não-classificatórios, aqueles que variam em função do objeto a que se aplicam, do sistema de avaliação do enunciador e/ou da sociedade na qual se insere e da situação de enunciação.

(1) Essa é uma atitude diferente.
            A possibilidade de antepor ou de pospor o adjetivo sem modificar a interpretação é característica essencial de empregos de adjetivos não-classificadores. Assim sendo, não se percebe diferença entre “atitude diferente” e “diferente atitude”, senão uma diferença de ordem enfática, o que nos permite dizer que “diferente” é um adjetivo não-classificador.
Em Essa é uma atitude diferente, o emprego do adjetivo não-classificador “diferente” anuncia simultaneamente:
a)      uma propriedade do nome (atitude), ou, conforme Dias, uma perspectiva do tema (atitude);
b)      uma avaliação do enunciador frente ao tema.
Percebe-se que “diferente” possui um caráter valorativo. Deve-se frisar que esse julgamento de valor, mesmo que pessoal (do enunciador), se apóia em códigos culturais (na historicidade) e que conforme o contexto da ação enunciativa o mesmo adjetivo parecerá mais ou menos subjetivo, dependendo do entendimento entre os interlocutores (uma atitude é “diferente” em relação a outras atitudes listadas na vivência dos interlocutores). Por isso mesmo ele só pode ser interpretado no interior da enunciação particular no qual figura

(2) O único cinema desta cidade fechou na semana passada.
Em primeira análise, o adjetivo “único” pode estar expressando surpresa, indignação e descontentamento do enunciador diante do fechamento do exclusivo/único cinema da cidade. Mas para “único” ter sentido estritamente classificador, de ser “um”, deveria estar posposto em forma de aposto: o cinema, único desta cidade, fechou na semana passada adicionando, assim, uma informação nova ao tema. Em segunda análise, podemos também interpretar como sendo o “único” cinema de qualidade na cidade, aquele, dentre outros existentes, que passa filmes de qualidade ou que tem uma estrutura física adequada conforme a avaliação do enunciador. Nesse caso, o adjetivo “único” delimita um referente tendo em vista outros referentes na memória do enunciador.
Assim, ao enunciar “o único cinema desta cidade fechou”, o enunciador não fornece ao tema apenas a perspectiva de ser “um só”, classificador, mas também a perspectiva avaliativa, elogiosa, de ser “único” sob o ponto de vista da subjetividade, de ser para ele o “único” da cidade que vale a pena, neste caso o adjetivo seria não-classificador, sendo a avaliação, “único”, da responsabilidade do enunciador, o que não implica que outros adotem esse mesmo julgamento de valor.

(3) Apenas João assistiu ao jogo.
O advérbio, segundo a definição das gramáticas tradicionais, deveria modificar um verbo, um adjetivo ou outro advérbio, mas, neste caso, está identificando e especificando, de forma classificatória, um substantivo: João, o sujeito que assistiu ao jogo, assumindo, assim, o valor de adjetivo.
Topicalizado, em posição anteposta ao tema, o advérbio “apenas” assume o espaço / o lugar do adjetivo, focalizando o tema (João) para expressar a indignação, a surpresa ou simplesmente a constatação do enunciador diante da audiência do jogo. Enquanto que se estivesse posposto ao tema, João apenas assistiu ao jogo, mudaria o significado da frase e retomaria a função de advérbio, modificando o verbo.

(4) Pedro é muito mais médico que o seu irmão.
O termo “médico”, em princípio substantivo, assume o comportamento de adjetivo evidenciado, já que ele vem intensificado por muito e mais, operação não incidente sobre substantivo.
Sendo assim, o substantivo “médico” está ocupando o lugar de adjetivo e três perspectivas podem ser inferidas nas seguintes paráfrases:
(4a) Pedro é muito mais competente/profissional que o seu irmão.
Neste caso ambos são médicos.
(4b) Pedro acerta mais os palpites de diagnósticos que o seu irmão.
Nenhum deles é médico, mas vivem “diagnosticando” as doenças das pessoas.
(4c) Pedro é muito mais meticuloso/minucioso que seu irmão.
Também neste caso nenhum dos dois é médico, mas considera-se ser “meticuloso/minucioso” uma característica de médicos.
 Ser “mais médico” / “mais competente” enuncia simultaneamente:
a)      uma propriedade do ser
b)      uma reação emocional do enunciador frente a esse ser
Nos três casos atribui-se a Pedro um predicado de caráter valorativo que se destaca de imediato como uma reação emocional do enunciador e não como atribuição de uma propriedade definível univocamente. Não diríamos, por exemplo, com a mesma facilidade esta mesma frase na negativa: Pedro não é muito mais médico o que o seu irmão (salvo ironicamente ou na retomada de um enunciador anterior). Esta divergência de comportamento deve-se, segundo Maingueneu, ao fato de os adjetivos não-classificadores não possuírem significados bem definidos, havendo diversas escalas de valor em seus empregos, dependendo do tema a que se aplicam, do sistema de avaliação do enunciador e/ou da sociedade na qual se insere e da situação de enunciação.

(5) Qual é a boa de hoje?
É a ocupação do lugar do substantivo elíptico que nos permite deduzir, recorrendo ao lugar de memória, como sendo “boa novidade” ou “boa notícia”.
O termo elíptico aponta para o tema – “notícia / novidade” – que (apesar de elíptico) se realiza na memória com relativa facilidade, pois, indubitavelmente, podemos associá-lo ao adjetivo “boa”.
Do ponto de vista referencial, o tema elíptico (notícia / novidade) não se realiza, mas é inferido pelos falantes graças à memória (historicidade) e à experiência que têm com o uso da língua. Podemos dizer que há um lugar sintático vago a ser ocupado no ato da fala, e que através do conhecimento que têm da estrutura da língua (organicidade), os falantes envolvidos no ato enunciativo têm a capacidade de preencher o que está subentendido, através do uso da memória.

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